O Canadá celebra o Mês da História Negra (Black History Month) em fevereiro de cada ano, reconhecendo as contribuições significativas dos canadianos negros ao longo da história. É um momento de reflexão sobre as suas vivências passadas e presentes, de confronto com as realidades do racismo e discriminação, e de luta para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva.
A nossa história começou com Mathieu Da Costa, um navegante e intérprete multilíngue com origens no então império colonial português, considerado o primeiro indivíduo negro registado no Canadá.
Após a Revolução Americana, no final do século XVIII, alguns dos Lealistas Britânicos que se estabeleceram no actual território das províncias canadianas do Atlântico eram negros livres e escravos que haviam lutado pelo lado Lealista. Foram eles que fundaram algumas das comunidades negras mais antigas do Canadá.
Entre 1800 e 1865, a conhecida rede secreta de rotas e esconderijos Underground Railroad facilitou a chegada de cerca de 20.000 escravos negros dos Estados Unidos, para viverem livremente no atual território do Canadá.
Muitos canadianos desconhecem ainda que a escravatura foi uma realidade no Canadá. Esta prática, comum na Nova França nos séculos XVII e XVIII, persistiu após a transferência para o domínio britânico. Os Lealistas Britânicos que se estabeleceram no Canadá trouxeram consigo escravos, e os negros livres que imigraram enfrentaram discriminação e violência.
Apenas nos últimos anos é que se tem vindo a reconhecer o problema do racismo sistémico no Canadá, evidenciado pelo caso de Viola Desmond, detida em 1946 por desafiar a segregação racial num teatro na Nova Escócia. Atualmente, o seu rosto figura na nota de 10$ do Canadá, prestando homenagem à sua coragem perante a contínua discriminação que sofreu.
Este ano, a Embaixada do Canadá teve o prazer de colaborar com a Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) para assinalar o Mês da História Negra em Portugal. No dia 29 de fevereiro, na Fundação Gulbenkian, contaremos com atuações de músicos reconhecidos afro-portugueses, bem como a apresentação de retratos de algumas figuras-chave da História Negra de Portugal, criados pela artista canadiana Jacquie Comrie. Esta celebração conjunta das nossas Histórias Negras reflete o nosso compromisso com os direitos humanos, igualdade e luta contra a discriminação. Como se diz, em Portugal, a união faz a força.
A celebração da História Negra no nosso país tem servido de mote para enfrentar injustiças históricas e honrar a nossa diversidade racial e cultural tal como ela é, a maior força do país. O multiculturalismo é política oficial desde 1971, e governos de todo o espectro político apoiam o acolhimento de imigrantes como política federal, reconhecendo as suas contribuições económicas, sociais e culturais. Em Toronto, mais de metade da população nasceu fora do país, e na emissora pública CBC é comum ver apresentadores de diversas origens étnicas.
Por sermos uma sociedade com tanta diversidade, são os valores comuns como a igualdade de género, diversidade e inclusão que nos unem. Acreditamos que a nossa vontade de enfrentar e tentar reparar erros históricos, representa uma contribuição valiosa para um mundo cada vez mais polarizado. Espero que a iniciativa de celebrar o Mês da História Negra em parceria com a AIMA possa ter um impacto positivo na valorização das comunidades afro-descendentes, em ambos os nossos países.
Author: Élise Racicot, Ambassador of Canada in Portugal
Source: Diário de Notícias | February 2024 – see original article